A maior parte dos membros do Ministério Público (MP) no Brasil é de homens brancos, de meia idade, com graduação ou pós-graduação. Eles são também pessoas engajadas com o debate público sobre temas sensíveis, como legalização do aborto, cotas raciais, casamento homoafetivo e pena de morte. O perfil foi traçado em um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio).
A pesquisa, realizada com membros de todos os estados brasileiros, mostra que quase metade ingressou entre 2001 e 2020 (47,9%). “Os dados refletem não apenas a renovação geracional, mas também possíveis mudanças nos processos seletivos e na estruturação da carreira ao longo das últimas décadas”, diz a pesquisa. Além disso, a maioria tem entre 41 e 60 anos (64,5%) e são homens (60,7%). “Há uma predominância masculina na composição do MP, refletindo uma possível desigualdade de gênero no ingresso e na permanência na carreira. Apesar disso, a participação feminina não é insignificante, evidenciando uma presença considerável, ainda que minoritária, dentro da instituição”, diz análise.
Sobre o nível de escolaridade, a maioria tem ensino superior completo (29,5%) e pós-graduação (33,8%). Sendo que 60,1% tem título de especialista.
Diversidade
Apesar de não ser um órgão muito diverso (76,7% se declaram brancos e 93,6% são heterossexuais), o Ministério Público tem a maioria dos membros engajados em assuntos de debate público. No âmbito das cotas raciais, por exemplo, 71,1% concordam muito ou pouco com a adoção desse sistema no serviço público.
Além disso, a respeito de assuntos ligados à comunidade LGBTQIAPN+, há também maioria de manifestações positivas. Ao menos 87,2% dos membros concordam muito ou pouco com a adoção por casais homoafetivos. No quesito casamento homoafetivo civil, 87,3% concordam muito ou pouco - sendo que 81,1% disseram que concordam muito.
Violência
Dentro dos temas relacionados à violência, alguns assuntos mostram uma opinião mais pulverizada entre os membros.
A descriminalização do uso de todas as drogas, cujo tráfico é um dos motivos para a escalada da violência no país, é vista com discordância por 66,9% dos membros. E 64,8% dos entrevistados concordam com a proibição de venda de armas de fogo. Sobre a redução da maioridade penal, 55,3% discordam muito ou pouco, enquanto 39,5% concordam muito ou pouco (5,2% não concordam e nem discordam).
A opinião sobre presunção de legítima defesa do policial militar em casos de letalidade também é mais fragmentada. Pelo menos 38,9% discordam muito, 16,7% discordam pouco, 19,7% concordam pouco e 9,9% concordam muito. Nesse assunto, chama atenção o percentual de membros “divididos”: 14,9% dizem que não concordam nem discordam. “Apesar de a maioria se posicionar contra a medida, há uma divisão considerável de opiniões, destacando a sensibilidade do tema entre os(as) membros(as) do Ministério Público”, diz a análise da pesquisa.
Apesar disso, o assunto pena de morte tem ampla maioria: 79,8% discordam muito ou pouco da pena de morte - e apenas 6,8% concordam muito.
Aborto
O tema aborto também tem opiniões mais diversificadas quando se trata da questão da legalização. Uma parcela de 55,8% concorda muito ou pouco. Já 28,7% discordam muito da legalização, e 8,5% discordam pouco. Já a opinião sobre a prisão de mulheres que interromperam a gravidez é mais consistente: 82,1% discordam muito ou pouco. Apenas 3,3% concordam muito.
Privatização
A privatização de empresas e negócios do governo é outro tema que aponta uma divisão quase equilibrada entre os membros: 24,8% discordam muito, 17,8% discordam pouco, 14% não discordam nem concordam, 27% concordam pouco e 15,3% concordam muito.
Outros percentuais
O percentual de membros do MP que concorda com o aumento de imposto pago pelos mais favorecidos economicamente para ampliar as políticas sociais é considerável: 58%.
Ao menos 87% acreditam que uma das principais características da política no Brasil é a presença de corrupção.
Já 76,2% pensam que o STF deveria ter uma atuação estritamente jurídica. E 74,7% não concordam com a mediação do Supremo em questões político-partidárias.
A pesquisa
A pesquisa “Quem são e o que pensam os(as) integrantes do Ministério Público no Brasil?”, editada pela Fundação Casa de Rui Barbosa, teve apoio do próprio MP e do governo federal e recebeu financiamento via Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT). Os pesquisadores Ludmila Ribeiro (CRISP/UFMG), Fábio Kerche (FCRB/Unirio) e Oswaldo E. do Amaral (UNICAMP) analisaram 2.054 respostas aos questionários enviados por e-mail a todos os membros do órgão no Brasil. O número significa cerca de 16% do total de membros, uma amostra significativa, segundo os pesquisadores.